sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O Endividamento a Prestações - Grande Entrevista

17 mil processos foram abertos, em 2010, pelo gabinete de apoio ao sobreendividado da DECO. O número de pedidos de ajuda, nestas três primeiras semanas de Janeiro, também já ultrapassou a quantidade da procura no mesmo mês do ano passado.
Estas são as estimativas dadas pela Dr.ª Natália Nunes, coordenadora do gabinete da instituição, à Grande Entrevista, da RTP.

A grande maioria da busca de apoio são famílias constituídas por três pessoas, com habilitações literárias equivalentes ao ensino secundário e mais de 90% já se encontram em situação negativa, praticamente impossível de auxílio.

A inovação da crise do século XXI é que se encontram endividadas tanto as famílias com rendimentos mensais de 300€, como as que perfazem 5.000€. As razões são as mesmas: os agregados não sabem adaptar o seu rendimento aos custos de vida.

O recurso ao crédito é um dos principais factores que resultam no endividamento das famílias portuguesas, quer de classe baixa, quer de média. Os indivíduos foram contratando vários créditos porque o seu orçamento assim lhes permitia. No entanto, mesmo com a descida de rendimentos, mantiveram esses créditos.

Grande parte das pessoas que recorrem ao gabinete de apoio ao sobreendividado possui mais de cinco créditos diferentes: automóvel, habitação e os restantes para gastos pessoais.
Muitas vezes, chegam a pedir novos créditos para poderem pagar os que já possuem. Forma-se assim uma bola de neve, uma vez que “as pessoas endividam-se mais para pagarem as dívidas”, explica a Dr.ª Natália. O gabinete ajuda o endividado a elaborar um plano de pagamentos, entra em contacto com as empresas em questão e negoceia esse mesmo plano.

Um dos graves problemas de requerer a um crédito é que os portugueses desconhecem os seus princípios básicos. Não sabem o que é a taxa EURIBOR ou o SPREAD, ou seja, nada é negociado na obtenção de créditos.
14 mil pessoas que recorreram à DECO não puderam ser ajudadas, pois já se encontravam em fase de processo judicial e, nesse caso, a entidade em nada pode interferir. As pessoas pedem ajuda demasiado tarde, essencialmente, por sentimento de vergonha. Vergonha por não conseguirem mais suportar o seu nível de vida, vergonha perante os seus vizinhos, familiares e entidade empregadora.

Com a taxa de desemprego nos 10,8%, a perspectiva para este ano, segundo a coordenadora, é que “o número de famílias em situação de dificuldade irá aumentar em 2011”. A taxa EURIBOR vai subir, aumentando o crédito habitação, que detém grande peso no orçamento familiar.

Natália Nunes aconselha os portugueses a fazerem o seu orçamento de rendimentos: quanto dinheiro possuem e onde está a ser gasto. Pequenos gestos como desligar as luzes ou fechar torneiras reduz o pagamento final.

Estamos perante uma nova forma de pobreza: “existe dinheiro, mas é todo absorvido pelos créditos”.

Com o aumento do IVA, o corte de salários e as restantes medidas do plano de austeridade, avizinham-se tempos de difícil erguer. Enquanto os portugueses não estiverem, verdadeiramente, mentalizados para a complexidade de um crédito e estiverem cientes de até onde se estende o seu orçamento, a DECO vai continuar a tentar acolher o desespero de quem não tem mais braços para segurar o peso das dívidas.

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